Brics contorna barreiras dos EUA em disputa tecnológica com China

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Uma das funções do Brics é enfrentar os obstáculos impostos pelos Estados Unidos e seus parceiros ao progresso econômico e tecnológico da China. Nações que enfrentam embargos econômicos de potências ocidentais, como o Irã e a Rússia, também necessitam do grupo para superar as pressões financeiras decorrentes das sanções. Nesse contexto, o Brasil precisa se manter em uma posição equilibrada entre os dois principais blocos geopolíticos em conflito, de modo a aproveitar as vantagens comerciais e tecnológicas.

A análise é de especialistas em relações internacionais que foram consultados pela Agência Brasil sobre a 16ª Cúpula do Brics, programada para ocorrer em Kazan, na Rússia, entre os dias 22 e 24 de outubro. O evento deverá contar com a presença de 23 líderes de nações. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não estará presente fisicamente no encontro devido a um acidente doméstico ocorrido no último sábado (19). Sua participação está prevista para ser realizada por videoconferência.

O docente de direito do comércio internacional da Universidade de São Paulo (USP), José Augusto Fontoura Costa. Imagem - José Augusto Fontoura Costa/Arquivo Pessoal.

De acordo com o professor de direito do comércio internacional da Universidade de São Paulo (USP), José Augusto Fontoura Costa, a China tem enfrentado sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos e pela Europa, que visam conter o progresso tecnológico da nação asiática.

As ações englobam restrições a investimentos chineses nos Estados Unidos, a proibição da exportação de tecnologias avançadas para a China e uma iniciativa para afastar empresas chinesas do desenvolvimento da internet 5G, que oferece alta velocidade.

"Os Estados Unidos estão engajados em uma evidente disputa comercial com a China, visando limitar o avanço econômico deste país. Em resposta, a China busca estabelecer um espaço para sua atuação econômica, o que é relevante para o Brasil e, de maneira geral, para todos os outros membros do Brics", comentou.

O expert em relações internacionais ressaltou que a principal área de conflito entre a China e os Estados Unidos se concentra em indústrias de alta tecnologia, como semicondutores, lançadores espaciais, biotecnologia, farmacêuticos e química sofisticada.

"É nesse contexto que se definirá quando e quem se tornará o novo protagonista hegemônico global, se os EUA permanecerão nesse papel, se a China tomará seu lugar ou se será alcançado um equilíbrio", observou.

Até o momento, o bloco BRICS era composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Neste ano, cinco novos países se juntaram aos integrantes: Irã, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Egito. Ademais, há a expectativa de que novos membros sejam revelados em breve.

A professora Maria Elena Rodríguez, coordenadora do grupo de pesquisa sobre os Brics na PUC do Rio de Janeiro, destacou que as potências ocidentais têm o interesse em manter o domínio sobre as tecnologias mais avançadas.

"Isso acontece devido ao interesse econômico. Se eu tiver o domínio de uma tecnologia que não está disponível para os outros, todos passarão a depender de mim, não apenas em termos financeiros, mas também em relação a suas necessidades. Essa é uma maneira de manter os outros países sob dependência. Isso é o que se entende como imperialismo e hegemonia; e, no que diz respeito à tecnologia, isso apresenta também aspectos de colonialismo”, esclareceu.

A especialista em relações internacionais opina que os Brics devem assumir uma função para intensificar a colaboração tecnológica entre os países membros.

A professora Maria Elena Rodríguez, responsável pela coordenação do grupo de pesquisa sobre os Brics na PUC do Rio de Janeiro, é especialista em relações internacionais. Foto: Maria Elena Rodríguez/Arquivo Pessoal.

"Certamente, as instituições financeiras ocidentais, como o Banco Mundial, não estão tão empenhadas em que os países realmente avancem em tecnologia. No entanto, acredito que essa é a função do Banco dos Brics, que tem auxiliado as nações a atingirem marcos significativos de desenvolvimento", acrescentou Maria Elena.

De acordo com o professor José Augusto, o Brics precisa organizar sistemas de financiamento e de comércio que possibilitem aos países avançar no desenvolvimento de tecnologias avançadas.

A investigação e a evolução tecnológica demandam consideráveis recursos financeiros, uma economia robusta e também um mercado para os produtos que você fabrica, além dos insumos que a nação utiliza. Há um grau significativo de integração econômica entre os países do Brics. Sem essa colaboração, a China não conseguiria, sozinha, alcançar o pioneirismo tecnológico. Portanto, o Brics é essencial", finalizou.

Aproximadamente 36% do Produto Interno Bruto (PIB) global é atribuído ao Brics, que ultrapassa o G7, conjunto das principais economias do mundo, formado por Estados Unidos, França, Reino Unido e Alemanha, que detém em torno de 30% do PIB mundial. Ademais, o Brics representa cerca de 42% da população do planeta.

Segundo a análise dos especialistas, o Brasil precisa encontrar seu lugar no bloco, sem deixar de lado sua relevância no grupo geopolítico sob a liderança dos Estados Unidos. O professor da USP, José Augusto, destacou que o Brasil deve tirar proveito de sua relação com a China para progredir tecnologicamente. Para esse especialista, o país detém tecnologias avançadas em campos como pesquisa agropecuária, aeronáutica, petróleo e gás, além de construção civil e geração de energia hidrelétrica.

“O Brasil não é uma terra desprovida de tecnologia. Temos um grande potencial, mas deixamos de avançar significativamente por não termos investido de forma apropriada em ciência e tecnologia. É importante destacar que nosso progresso tecnológico sempre contou com o apoio do governo, através de instituições como a Petrobras, Embrapa e Embraer, que, embora seja uma empresa privada, ainda recebe investimentos públicos”, esclareceu.

De acordo com a professora Maria Elena Rodríguez, da PUC Rio, o Brasil tem buscado estabelecer uma agenda focada em tecnologia através do projeto de neoindustrialização implementado pelo governo federal.

"O Brasil está sugerindo que a China se torne um parceiro significativo, especialmente em tecnologias sustentáveis que apoiarão o Brasil em sua reindustrialização. Acredito que o país está se posicionando de forma assertiva em suas iniciativas de cooperação e no fortalecimento das nações do Sul Global", complementou.

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