Escala 6x1: posts cortam entrevista em que Erika Hilton cita estudos que levou em conta para PEC
O que está sendo divulgado é que a deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) teria admitido em uma entrevista à GloboNews que não há uma análise de viabilidade sobre os efeitos adversos da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que visa eliminar a jornada de trabalho 6x1 - seis dias trabalhados e um dia de descanso por semana.
Viabilidade do Card PEC 6x1.
Imagem: Reprodução do Instagram / Estadão
O Estadão Verifica realizou uma investigação e constatou que a informação é falsa. Em uma entrevista na segunda-feira, 11, a deputada afirmou que não existe um estudo específico avaliando o impacto que a diminuição da jornada de trabalho teria sobre os preços dos medicamentos. Ela ressaltou que sua proposta se baseou em pesquisas e experiências de outros países que implementaram uma carga horária diferente. As publicações analisadas omitiram a parte da entrevista em que Erika faz referência a esses estudos.
Na mesma entrevista, ela afirmou que seria preciso realizar mais debates, pesquisas e avaliações para garantir que a alteração não cause um efeito adverso na economia, nem um aumento "tão drástico" nos preços. Essa parte do seu discurso também foi omitida nos vídeos enganosos.
Ao ser procurada, a deputada confirmou que estava se referindo a uma pesquisa sobre o custo dos medicamentos. A assessoria de Erika afirmou que existem estudos mais abrangentes sobre a diminuição da carga horária de trabalho e ressaltou que a fundamentação da PEC apresenta dados concretos de outras realidades. "A pergunta (na entrevista da GloboNews) foi bastante específica para o setor farmacêutico no Brasil, com implicações nos preços dos remédios. É um tema muito focado, enquanto a PEC é uma proposta de emenda à Constituição que ainda não foi protocolada e que aborda a jornada de trabalho de maneira geral. Há muitos debates que ainda precisam ser realizados", declarou a equipe da deputada.
Saiba mais: A deputada Erika Hilton é a responsável pela PEC que tem como objetivo diminuir a carga horária de trabalho dos brasileiros. Atualmente, a carga é de até oito horas por dia, totalizando 44 horas por semana. A proposta sugere a redução para uma jornada de quatro dias de trabalho por semana, com um limite de oito horas diárias e 36 horas semanais, preservando os salários e os benefícios trabalhistas vigentes.
Na manhã desta quarta-feira, 13, foram coletadas 194 assinaturas para iniciar uma discussão sobre a PEC, superando o mínimo requerido de 171. Mais tarde, durante uma coletiva de imprensa, a deputada explicou que ainda não havia protocolado a proposta, pois estava em busca de mais assinaturas. Assim que for protocolada, a PEC começará a ser analisada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Até às 14h40 desta quinta-feira, 14, a proposta contava com 232 assinaturas registradas no sistema da Câmara.
A fala da deputada foi interrompida.
A parte utilizada nos vídeos que se tornaram populares foi extraída de uma entrevista que Erika concedeu ao programa Em Pauta, da GloboNews, na noite da última segunda-feira, dia 11. Naquele momento, a PEC ainda não contava com o número necessário de assinaturas para dar início ao seu trâmite.
Erika respondeu a questionamentos de seis repórteres; o segundo foi o analista Gerson Camarotti. Ele aproveitou a situação do vereador eleito do Rio de Janeiro, Rick Azevedo (PSOL), criador do movimento Vida Além do Trabalho (VAT), para indagar se a proposta de emenda constitucional apresentada por Erika incluía algum estudo sobre a viabilidade do aumento nos preços dos medicamentos. Azevedo exercia a função de balconista em uma farmácia.
A indagação completa de Camarotti é:
- Deputada, eu estava conversando com o deputado Tarcísio, que foi candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro, logo após o término das eleições, e ele mencionou o Rick Azevedo. Ele comentou sobre a campanha que foi proposta, que de fato teve grande repercussão no Rio de Janeiro, o que me chamou bastante a atenção. Realmente, essa proposta possui uma aceitação significativa entre os trabalhadores brasileiros. Contudo, gostaria de abordar a questão da viabilidade... Por exemplo, o Rick, que é vereador pelo PSOL, seu partido, possui formação na área de farmácia e foi funcionário de uma farmácia. Com base nesse exemplo, a senhora possui algum estudo sobre a viabilidade desse projeto e quais seriam os custos envolvidos no aumento dos preços dos medicamentos? Pois, se for necessário contratar mais pessoas para manter a farmácia em funcionamento, isso certamente gera um custo. Gostaria de saber quais estudos foram realizados para fundamentar essa proposta.
"- Camarotti, não dispomos de um estudo tão detalhado quanto esse, que responda a essas questões específicas. Analisamos a situação sob a perspectiva do mercado de trabalho e das flexibilizações que outros países e pesquisas têm apontado em relação à economia. É claro que estamos cientes de todos os impactos que podem surgir. Por isso, protocolamos uma audiência pública na Comissão de Direitos Humanos da Câmara, para que possamos ter a oportunidade de debater. Não podemos ignorar que a situação do trabalhador atualmente é extremamente precária, e nenhum tipo de argumento poderá justificar a permanência dessa realidade. É evidente que precisamos nos aprofundar, é necessário realizar mais estudos e análises. No momento, o que estamos afirmando é que o trabalhador deve ser considerado, observado e atendido. Para isso, precisamos modificar alguns mecanismos e compreender como podem ser sustentáveis e aplicáveis. Esse processo exigirá longos debates, pesquisas e um aprofundamento maior. No entanto, sem qualquer dúvida, com base em outros estudos, que não são tão específicos quanto esse que você mencionou, e em diferentes modelos de trabalho, estamos convencidos de que é possível, sim, implementar essas mudanças no Brasil sem causar um impacto absurdo na economia ou um aumento acentuado nos preços. Outros lugares já conseguiram, nós também podemos."
A declaração integral da deputada dura 1 minuto e 35 segundos, iniciando aos 39:05 do programa e finalizando aos 40:40. No entanto, a parte utilizada nos vídeos que se tornaram virais é apenas de seis segundos. O único segmento que é exibido nos clipes é a primeira frase proferida pela parlamentar, seguida de um corte abrupto: "Camarotti, não dispomos de um estudo tão detalhado quanto esse, que responda a essas indagações".
Pesquisas são mencionadas na fundamentação da PEC.
Na fundamentação da PEC, são mencionadas experiências de outros países que adotaram a medida, como o Reino Unido, que realizou um projeto piloto de redução da carga horária através da iniciativa 4 Day Week. Nesse piloto, que ocorreu em 2023, 61 empresas participaram, e os resultados mostraram que 92% das instituições envolvidas optaram por manter a jornada de quatro dias, enquanto 1,4% reportaram um aumento no faturamento. Entre os colaboradores, 39% relataram uma diminuição no estresse, 71% apresentaram redução nos sintomas de burnout e 54% achavam mais fácil equilibrar a vida pessoal com a profissional.
Um projeto similar foi realizado no Brasil neste ano, de janeiro a junho, envolvendo 21 empresas. Os resultados foram apresentados em agosto, com informações coletadas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Dentre as empresas participantes, 72% indicaram que houve um crescimento na receita, e 84,6% sugeriram a implementação da semana de quatro dias para outras organizações. No que diz respeito aos funcionários, 44,4% afirmaram ter aumentado sua capacidade de cumprir prazos, 65% notaram uma diminuição na fadiga e 74% relataram uma melhora na saúde física.
A fundamentação do projeto menciona ainda uma publicação de 2010 do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Essa nota técnica aborda a diminuição da carga horária e propõe uma nova legislação que beneficie os trabalhadores, que têm enfrentado consequências prejudiciais devido às longas e extenuantes jornadas de 44 horas por semana.
Existem objeções à PEC. A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) declarou que, caso seja aprovada, a proposta geraria "um aumento imediato nos custos operacionais das empresas". "O efeito econômico direto dessa alteração poderá levar muitas empresas a precisar reduzir o número de funcionários para se ajustar à nova realidade de despesas, a desacelerar os salários de novas contratações, a encerrar atividades em determinados dias, o que compromete o desempenho do setor e eleva o risco de transferir o desequilíbrio para o consumidor", mencionou a organização.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta quinta-feira, 14, que a PEC "vai encarecer o trabalho, vai elevar a informalidade e vai comprometer a produtividade". O economista Pedro Fernando Nery declarou em entrevista ao Estadão que a diminuição da carga horária para 36 horas resultaria em um acréscimo de cerca de 15% no custo da hora trabalhada, o que poderia resultar na suspensão de novas contratações, na elevação da inflação de serviços e até mesmo na redução da força de trabalho.