Eslovênia x Sérvia: jogo da Eurocopa faz reencontro de nações que já formaram uma só seleção

Sérvia E Eslovênia São Herdeiras Da Iugoslávia, Reconhecidas Pela Fifa

20 de junho de 2024 - 08:08 da manhã

O jogo entre Eslovênia e Sérvia nesta quinta-feira, 20 de junho, às 10h (horário de Brasília), válido pela segunda rodada da Eurocopa 2024, carrega consigo um histórico geopolítico. Ambas as seleções integravam a antiga Iugoslávia e enfrentaram conflitos decorrentes de movimentos separatistas durante os anos 90. Enquanto a Eslovênia foi uma das primeiras a conquistar sua independência, juntamente com a Croácia em 1991, sofreu menos impacto no processo de dissolução em comparação com seus vizinhos.

No âmbito do futebol, a Fifa reconhece a Sérvia como herdeira oficial da seleção iugoslava. Destacam-se na história da Iugoslávia conquistas como o terceiro lugar na Copa do Mundo de 1930 e o quarto lugar em 1962; os vice-campeonatos da Eurocopa em 1960 e 1968, além de cinco conquistas olímpicas, incluindo uma medalha de ouro em 1960. O antigo país foi sede do campeonato europeu de seleções em 1976.

Desde a separação do antigo país, surgiram as equipes nacionais da Sérvia, Eslovênia, Bósnia, Croácia, Montenegro, Kosovo e Macedônia do Norte. Os confrontos mais intensos geralmente acontecem entre Sérvia e Croácia, Bósnia ou Kosovo, devido aos conflitos geopolíticos. Nas duas últimas edições da Copa do Mundo (2018 e 2022), o meio-campista Shaqiri chamou a atenção ao provocar jogadores e torcedores sérvios. Embora ele represente a Suíça, nasceu em uma região que atualmente pertence ao Kosovo.

Após a conclusão da Primeira Guerra Mundial em 1918, a formação da Iugoslávia resultou da união de territórios sérvios, croatas e eslovenos. Enquanto os sérvios tinham maior influência na governança, os croatas e eslovenos permaneciam mais distantes. Durante a Segunda Guerra Mundial, sob pressão das nações europeias do Eixo (Alemanha e Itália), a Iugoslávia, cujo monarca era sérvio, concordou em se tornar um Estado satélite da Alemanha. No entanto, grupos nacionalistas sérvios se rebelaram contra essa decisão, sendo posteriormente derrotados pelas forças alemãs. Após a queda da monarquia, um governo totalitário de origem croata foi estabelecido no país.

A Croácia assumiu a liderança desse Estado e começou a perseguir os sérvios. Foram criados campos de concentração e extermínio, alegando que os sérvios não eram dignos de liderança e tinham invadido território croata, apesar do forte vínculo religioso entre eles. De acordo com o professor de História Contemporânea da UFRJ, Vinícius Liebel, a religião predominante na Croácia é o catolicismo, enquanto a maioria dos sérvios são cristãos ortodoxos. Na região, também há uma significativa presença muçulmana, fruto da influência do Império Turco-Otomano.

Após a Guerra, grupos de oposição croata tomam o controle do país, que ainda faz parte da Iugoslávia, mas mantêm relações próximas com o bloco socialista liderado pela União Soviética. O professor explica que houve tentativas de criar uma memória coletiva para formar uma identidade iugoslava, mas os regionalismos prevaleceram, dificultando esse processo.

Nos anos 70 e 80, houve um aumento das disputas entre os nacionalismos dentro de um mesmo país. Além disso, as dificuldades econômicas fortaleceram movimentos em busca de autonomia em relação à Iugoslávia. Segundo Liebel, a separação foi mais repressiva na Croácia e na Bósnia e Herzegovina, enquanto na Eslovênia foi menos intensa, devido a diferenças culturais em relação aos demais estados.

Após a declaração de independência, a Eslovênia se envolveu em um conflito de dez dias com a Sérvia, sendo prontamente reconhecida pelos sérvios. Esta situação foi bem diferente da vivida pelos croatas e bósnios, que enfrentaram guerras. "Foram processos extremamente violentos e traumáticos, que deixaram cicatrizes profundas nas famílias até os dias de hoje. Essas marcas permanecem visíveis. E então, temos os jogadores de futebol sempre relembrando o passado. Nos jogos, especialmente entre Sérvia e Croácia, percebemos que as rivalidades não são apenas esportivas", afirmou o pesquisador.

Na competição, a Sérvia começou com uma derrota para a Inglaterra e ocupa o último lugar do Grupo C. Enquanto isso, a Eslovênia empatou nos acréscimos contra a Dinamarca. O jogo desta terça-feira será crucial para o destino das duas seleções no Eurocopa. Se os sérvios forem derrotados, é quase certo que estarão fora do torneio. A situação ainda pode depender do resultado da outra partida do grupo, entre dinamarqueses e ingleses, também nesta terça-feira, mas às 13h (horário de Brasília).