Os prós e contras do horário de verão, que pode voltar sob Lula | Economia

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Horário de verão

A prática de adiantar os relógios em uma hora era implementada anualmente em algumas regiões do Brasil com o objetivo de reduzir o consumo de energia, aproveitando melhor a luz natural. No entanto, essa medida foi abolida em 2019, durante a presidência de Jair Bolsonaro (PL).

Naquele período, a administração defendeu que a redução no consumo de energia gerada era irrelevante e não valia a pena realizar a alteração.

Em entrevistas recentes, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, tem apoiado a reintrodução do horário de verão, sustentando que essa ação atende a duas metas fundamentais na administração do sistema elétrico: assegurar a segurança energética e manter tarifas acessíveis - ou seja, que o valor da conta de luz seja justo.

De acordo com o ministro, é necessário analisar essa proposta, uma vez que afeta a vida da população. Além disso, sua implementação está sujeita a uma decisão política por parte do governo.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e o Operador Nacional do Sistema (ONS) estão preparadas para divulgar, nos próximos dias, uma análise acerca do horário de verão nas condições atuais. A decisão final ficará a cargo de Lula.

A História Do Horário De Verão No Brasil

O horário de verão foi implementado no Brasil pela primeira vez em 1931, sob a administração de Getúlio Vargas.

O horário de verão foi implementado no Brasil em 1931 durante a administração de Getúlio Vargas — Foto: Getty Images via BBC.

A mesma medida foi implementada em anos posteriores, porém sem uma regularidade específica. A partir de 1985 — um ano que ficou marcado por uma seca sem precedentes, que ocasionou apagões e racionamento de água —, a alteração de horário começou a ser aplicada anualmente, com duração e área de abrangência estabelecidas por decretos emitidos pelo presidente.

Em 2008, uma norma estabeleceu que o horário de verão seria implementado de forma permanente, iniciando no terceiro domingo de outubro e se estendendo até o terceiro domingo de fevereiro do ano subsequente.

Foi somente em abril de 2019 que o então presidente Jair Bolsonaro resolveu abolir a prática por meio de um decreto.

Quais são os prós e contras da alteração do horário? A seguir, apresentamos alguns dos pontos levantados pelos defensores e opositores dessa proposta.

Com a alteração do horário dos relógios para uma hora a mais, as áreas que implementam o horário de verão desfrutam de uma hora extra de luz ao entardecer, o que retarda a necessidade de acender lâmpadas e ligar eletrodomésticos ao voltarem do trabalho para suas residências.

Historicamente, a economia gerada por essa medida correspondia a aproximadamente 4% a 5% da demanda durante os períodos de maior consumo.

Ao eliminar o horário de verão em 2019, o governo Bolsonaro sustentou, apoiado em informações do ONS, que o ápice da demanda durante o verão havia se alterado ao longo dos anos, passando do final da tarde para o meio do dia, em razão do uso dos aparelhos de ar condicionado nas empresas.

Nesse contexto, a economia prevista com a implementação do horário de verão varia entre 0,5% e 0,7%. No entanto, especialistas da área de energia elétrica afirmam que qualquer tipo de economia é importante, especialmente considerando a severa seca que enfrentamos atualmente e a possibilidade de uma rápida diminuição nos níveis dos reservatórios das usinas hidrelétricas.

As fontes de energia eólica e solar aumentaram sua participação na matriz elétrica do Brasil, atingindo 15% e 7% da capacidade instalada de geração em junho de 2024, conforme informações da Aneel — Foto: Getty Images via BBC.

Nivalde de Castro, docente do Instituto de Economia e responsável pelo Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel) na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), destaca que o setor elétrico no Brasil passou por transformações desde 2019, com um aumento na contribuição das fontes de energia eólica e solar na matriz energética do país.

De acordo com o especialista, essas fontes, que têm uma produção maior durante o dia, podem ser utilizadas de forma mais eficiente com a implementação do horário de verão, diminuindo a necessidade de utilização das usinas térmicas, que geram energia a um custo mais elevado e com maior impacto ambiental.

"Anteriormente, a alteração do horário visava reduzir o consumo durante o pico no final da tarde. Atualmente, a intenção é aproveitar ao máximo a energia gerada pelo vento e pelo sol, ao mesmo tempo em que preserva os reservatórios de água. Essa é a justificativa técnica."

Edvaldo Santana também aponta que o nível atual dos reservatórios hidrelétricos – superior a 50% em todas as áreas do país – continua sendo considerado confortável.

O ex-diretor da Aneel aponta que a questão é que eles estão reduzindo cerca de 8 pontos percentuais a cada mês. Dessa forma, até o começo da época de chuvas nas regiões Sudeste e Centro-Oeste do Brasil, que concentram a maior parte dos reservatórios de hidrelétricas do país (aproximadamente 70% do total), esses reservatórios podem atingir níveis de 30% ou até menos, o que já é considerado crítico.

O horário de verão retornará?

Além da possibilidade de reintrodução do horário de verão, a Aneel ativou em setembro, pela primeira vez desde 2021, a bandeira vermelha nas faturas de energia. Essa é uma maneira de alertar os consumidores, por meio do aumento tarifário, que é necessário diminuir o consumo.

O ONS poderá realizar, ainda este ano, leilões para contratar diminuições temporárias no consumo de energia por grandes indústrias. Com essa abordagem, o governo tem como objetivo estimular grandes consumidores industriais a reduzir provisoriamente seu uso de energia durante os horários de maior demanda, oferecendo uma compensação financeira em troca.

Aumento nas vendas do comércio e nos estabelecimentos de bebidas.

Uma outra vantagem do horário de verão é o impulso nas vendas do comércio e dos estabelecimentos, decorrente da hora adicional de luz natural.

"A maior quantidade de luz natural no início da noite torna as ruas mais convidativas, dando um impulso ao comércio. O fluxo de clientes em bares e restaurantes também aumenta", afirma Paulo Solmucci, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel).

“Projeções indicam um crescimento de até 15% nas receitas devido à alteração nos relógios”, afirma um porta-voz da indústria de bares e restaurantes — Foto: Getty Images via BBC.

Na segunda-feira (16/9), a Abrasel encaminhou uma correspondência ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, apresentando justificativas a favor do retorno do horário de verão.

A Abrasel mencionou, entre seus argumentos, um estudo feito em colaboração com o site Reclame Aqui, que revelou que 54,9% dos entrevistados estão a favor da reintrodução do horário de verão no Brasil em 2024.

Para 16,9% das pessoas, a alteração não faz diferença. Já 28% expressaram estar contra.

O estudo consultou 3 mil indivíduos e apresenta uma margem de erro de 2 pontos percentuais, tanto para mais quanto para menos.

Um terceiro ponto a favor do horário de verão é a segurança.

Uma pesquisa de 2016 conduzida por cientistas da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) examinou informações sobre a frequência de acidentes de trânsito ocorridos entre 2007 e 2013. De acordo com os resultados, nos Estados que implementaram o horário de verão, houve uma diminuição de 10% no número de acidentes em rodovias federais.

"Os experimentos mostraram que a mudança no período de intensidade da luz diurna desempenha um papel significativo na diminuição de acidentes nas estradas federais", afirmaram os pesquisadores.

Atividades físicas e aproveitamento do espaço público.

Por último, um último ponto levantado pelos defensores do horário de verão é a chance de praticar atividades físicas no final da tarde e de aproveitar de maneira mais eficiente os espaços públicos.

O ponto de vista foi mencionado até por Luciano Hang, proprietário das lojas Havan e apoiador de Bolsonaro, mas que defende o retorno do horário de verão.

Aqueles que apoiam o horário de verão afirmam que ele possibilita uma melhor utilização dos espaços públicos — Foto: Getty Images via BBC.

O principal ponto levantado por aqueles que são contra a retomada do horário de verão é que a adaptação pode ser complicada e que a mudança afeta o ritmo biológico.

Uma pesquisa realizada por cientistas brasileiros e divulgada em 2017 na revista Annals of Human Biology, que contou com mais de 12 mil participantes, revelou que menos de 50% (45,43%) afirmaram não experimentar nenhum tipo de desconforto em relação à alteração no horário.

Aproximadamente 25% afirmavam sentir-se desconfortáveis ao longo de todo o período de adaptação ao novo horário.

A dificuldade em se adaptar possui causas biológicas: a mudança de horário afeta a produção de hormônios como a melatonina e o cortisol, que têm, respectivamente, a função de induzir o sono e de despertar o organismo.

A transição geralmente é mais difícil para os adolescentes, que enfrentam dificuldades para levantar cedo para as aulas matutinas, e para as crianças pequenas, que precisam de mais horas de sono e tendem a reagir de forma sensível às alterações na luz.

Alterações no ciclo da agropecuária.

Uma outra desvantagem do horário de verão, conforme argumentam os críticos da prática, é o impacto negativo que ele exerce sobre o setor agrícola e pecuário.

O gado bovino, por sua vez, é vulnerável à alteração do horário nas propriedades rurais, o que pode impactar até mesmo a produção de leite.

Especialistas que se opõem à iniciativa afirmam que ela impacta negativamente o setor agrícola — Foto: AFP via BBC.

No entanto, existem pessoas que atuam na agricultura e não se preocupam com a alteração.

"As empresas alteram o horário de início, passando de 7h para 8h para o cultivo da soja, o que não traz prejuízos. Na minha opinião, isso é positivo", afirmou Antônio Rodrigues da Silva, presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Assalariados Rurais de Sapezal (MT), também em uma entrevista naquele ano.

Horários variados por todo o Brasil.

Uma terceira desvantagem é a maior falta de sincronia nos horários em todo o Brasil.

O Brasil é uma nação imensa, possuindo quatro fusos horários distintos: o de Brasília, que cobre todas as regiões Nordeste, Sudeste e Sul, além dos estados do Pará, Amapá, Tocantins, Goiás e o Distrito Federal; o de Fernando de Noronha, que está uma hora adiantado em relação a Brasília; o do Amazonas, Roraima, Rondônia, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, situado uma hora atrás de Brasília; e, por fim, o do Acre e a parte ocidental do Amazonas, que se encontra duas horas atrás de Brasília.

Durante o horário de verão, as regiões Norte e Nordeste não seguem essa alteração, uma vez que sua proximidade com o Equador torna a mudança irrelevante.

Dessa forma, durante o horário especial, Roraima, Rondônia e Amazonas terão uma diferença de duas horas em relação a Brasília, enquanto o Acre terá uma diferença de três horas.

Isso torna desafiadora, por exemplo, a organização de eventos em nível nacional, a ponto de que, em 2018, a duração do horário de verão foi reduzida em razão das eleições.

Atendendo a solicitação do então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, o início do horário de verão naquele ano ocorreu apenas em novembro, com o objetivo de prevenir atrasos na contagem dos votos e na divulgação dos resultados.

Esta matéria foi veiculada pela primeira vez em setembro de 2021 e foi recentemente atualizada com dados sobre a situação atual em 2024.

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