“Jesus pregou na periferia do Império Romano”, aponta frei David Santos

12 horas voltar
Jesus

Resumo: A série "Visão do Corre" conta a história do nascimento, da trajetória e da morte de um Jesus proveniente da periferia. Este relato aborda a vida de um pregador oriundo do campo, que era visto como marginalizado e, de certa maneira, transgressor, já que confrontava tanto o poder político romano quanto as crenças religiosas convencionais.

Jesus - Figure 1
Foto Terra

Frei David Santos, criador da Educafro, uma rede de cursos preparatórios, possibilitou que mais de 100 mil jovens negros e de baixa renda acessassem o ensino superior.

Jesus cresceu na periferia. “Se analisarmos os evangelhos com cuidado, a única vez que ele entrou em uma cidade foi em Jerusalém, e isso para morrer”, recorda André Leonardo Chevitarese, professor titular na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

"Jesus se move por áreas marginais, é uma figura periférica e nômade. Há um aspecto curioso: sempre que ele frequenta a sinagoga, ocorrem conflitos. Ele é expulso e mal compreendido. A única ocasião em que ele é levado ao palácio, está preso, aguardando o julgamento do governador Pilatos", afirma o padre Júlio Lancellotti.

E, ao olhar para seus discípulos, ele declarou: felizes são vocês, os pobres, pois o Reino de Deus pertence a vocês – Lucas, 6:20.

Nas cidades residiam os donos de terras, os soldados e os líderes, que exigiam impostos elevados. Nos núcleos de poder, Jesus estaria em destaque. Percorrer áreas periféricas, como povoados e pequenas localidades, foi uma escolha estratégica.

Jesus - Figure 2
Foto Terra

Frei David dos Santos, um franciscano e criador da rede de cursinhos Educafro, afirma que “assim como no tempo de Jesus, muitos líderes religiosos estão mais focados em suas posições políticas e financeiras do que no verdadeiro cuidado com as pessoas”.

"Segundo André Chevitarese, a imagem mais precisa de Jesus que temos criado como pesquisadores é a de um homem com raízes rurais."

Jesus: O Homem Das Periferias E Do Povo

Chevitarese, autor de "Jesus de Nazaré: uma Outra História", relata que o período em que Jesus viveu era marcado por um ambiente de opressão e insatisfação. Das frutas, legumes, grãos e peixes, três em cada quatro eram confiscados como impostos.

"Trata-se de uma repressão brutal, com uma insurreição de agricultores bastante semelhante ao cenário de Nazaré", afirma Chevitarese. De fato, a apenas seis quilômetros de distância, a cidade de Séforis foi tomada por camponeses sob a liderança de Judas, o Galileu. Os insurgentes incineraram as dívidas com os proprietários de terras.

É mais simples para um camelo atravessar o buraco de uma agulha do que para um homem rico adentrar o Reino de Deus – Mateus, 19:23.

Jesus - Figure 3
Foto Terra

Profetas como Jesus eram indivíduos à margem da sociedade. "Ninguém desejava ser pastor, a higiene era deficitária, dormiam ao ar livre e não conseguiam cumprir os rituais de pureza do judaísmo, vivendo como verdadeiros vagabundos", relata o padre Júlio Lancellotti.

"Os profetas sempre estiveram ao lado do seu povo, nunca em condições de luxo ou em situações privilegiadas", afirma o sheik Rodrigo Jalloul, da mesquita da Penha, em São Paulo. Apesar de ser muçulmano, ele tem grande respeito por Jesus e sua mensagem, além de realizar ações sociais em apoio a pessoas em situação de rua.

O principal princípio do padre Júlio Lancellotti se baseia em uma passagem da carta aos Coríntios: “Deus optou pelo que é frágil para desestabilizar o que é poderoso”.

Pregação De Jesus Levava à Prisão

“Existe aquele célebre instante em que Jesus adentra o templo e, utilizando um bastão, afasta os que estavam realizando vendas. Ele teve que agir de forma decisiva para evitar que desconsiderassem a verdadeira essência da igreja”, afirma Frei David.

Líderes carismáticos que confrontam a autoridade central foram historicamente reprimidos, assim como aconteceu com Jesus. De acordo com Chevitarese, ele "se posiciona de maneira crítica diante do mundo" com uma "visão voltada para a transformação da realidade".

Jesus - Figure 4
Foto Terra

O Espírito do Senhor repousa sobre mim, pois Ele me capacitou para anunciar boas novas aos necessitados – Lucas 4:18.

De acordo com o padre Júlio Lancellotti, Jesus questiona três fundamentos essenciais da autoridade: primeiro, Deus é apresentado como o “pai afetuoso que está entre nós”; segundo, a ideia de nação, já que todos são convocados; e por último, a família, que se integra por vínculos afetivos, sem exigir necessariamente laços biológicos. “Esse conceito era intolerável para os poderosos”.

Por essa razão, a punição imposta a Jesus foi rigorosa. "Os crucificados são marginalizados, a cruz é destinada aos destituídos e aos que sofrem. Se compararmos, as forças da morte atacam esses indivíduos da classe menos favorecida, como os negros, as negras, os indígenas e os nordestinos pobres. Para eles, a resposta é a violência", observa Chevitarese.

Iyalorixá Roberta de Yemonjá, da Casa das Águas de Yemonjá, afirma: "Existem coincidências que não devemos ignorar".

Imagem: Ana Beatriz Marques

Quem Jesus Abraçaria Nos Dias De Hoje?

O rabino Alexandre Leone afirma que “o cerne da mensagem dos profetas não nos conduz às moradas metafísicas do pensamento, mas sim aos cortiços de Jerusalém”. Adaptando essa ideia para os dias de hoje, “o ponto crucial é o órfão, a viúva, o imigrante, os moradores de favelas; é a concretização do humano como instrumento da ação divina”.

Jesus - Figure 5
Foto Terra

A ialorixá Roberta de Yemonjá, da Casa das Águas, localizada em Sepetiba, na região oeste do Rio de Janeiro, compartilha uma perspectiva semelhante. "Eu vejo Jesus como alguém que faz parte do povo que utiliza o trem, o metrô, as mães pretas, as mulheres de favela, e os homens negros que temem andar sem documento de identidade. Jesus representa essa população, esse povo", afirma.

O pai Denisson D'Angiles, religioso da umbanda, oferece alimento e assistência a pessoas em situação de rua em São Paulo.

“No Brasil, uma realidade parecida é o esforço de fornecer alimentação a indivíduos em situação de rua e em vulnerabilidade social, como as cozinhas solidárias, que têm o mesmo propósito de proporcionar dignidade e esperança aos mais marginalizados”, afirma o pai Denisson D'Angiles, sacerdote de umbanda.

Segundo o pastor Leandro Rodrigues, “a principal mensagem é a transformação dos valores mundanos: no reino de Deus, o que realmente conta não é a fortuna, mas a empatia, a modéstia e a luta por justiça social”.

Ler mais
Notícias semelhantes
Notícias mais populares dessa semana