Atritos entre Lula e Maduro ganham força às vésperas da eleição na Venezuela

25 Julho 2024
Maduro

A ligação entre Lula (PT) e Nicolás Maduro está longe de ser tão amigável como a entre o petista e Hugo Chávez, durante o período da "onda rosa" na América Latina nos anos 2000. Com a aproximação das eleições presidenciais na Venezuela, surgem tensões entre os dois líderes.

No domingo, Maduro tentará conquistar seu terceiro mandato de seis anos, o que significaria que o chavismo permanecerá no poder por mais de três décadas. Seu adversário principal é Edmundo González, apoiado por María Corina Machado, líder da oposição, que foi impedida pela Justiça venezuelana de se candidatar.

Por um longo período, Lula tem sustentado a importância de aceitar o resultado de uma eleição legítima na Venezuela, não importando quem saia vitorioso, porém era pressionado pela oposição e pela mídia empresarial a ser mais contundente em suas críticas a Maduro.

O conflito se intensificou depois que Maduro declarou, em um comício na semana passada, que a nação poderia enfrentar uma "guerra civil" e sofrer um "derramamento de sangue" caso a oposição vença.

Lula expressou surpresa diante da declaração de Maduro, em entrevista às agências internacionais na última segunda-feira, dia 22. Segundo o ex-presidente, "É uma lição política: quem perde as eleições deve aceitar o resultado. Maduro precisa compreender que, quando se vence, permanece-se no poder, mas quando se perde, é hora de deixar o cargo."

Um dos representantes do governo brasileiro que estarão presentes em Caracas é o assessor presidencial Celso Amorim, que já ocupou o cargo de chanceler e desempenhou um papel fundamental na definição da política externa dos governos do Partido dos Trabalhadores.

Já comuniquei ao Maduro em duas ocasiões - e ele está ciente disso - que a única maneira de a Venezuela retornar à normalidade é por meio de um processo eleitoral reconhecido internacionalmente", afirmou Lula.

A resposta de Maduro foi sutil, mas não passou despercebida. "Não falei mentiras. Apenas fiz uma ponderação. Quem se incomodou que beba um chá de camomila", afirmou o venezuelano na terça-feira, dia 23. "Na Venezuela, a paz, o poder popular e a perfeita união cívico-militar-policial irão prevalecer."

Mais tarde, em um evento político, ele questionou a integridade das urnas eletrônicas usadas no Brasil. Naquela ocasião, afirmou que a Venezuela possui "o sistema eleitoral mais eficiente do planeta", com verificação de 54% das urnas.

"Em qual outra região do globo isso é feito? Nos Estados Unidos? É possível auditar o sistema eleitoral lá? E no Brasil? Não há auditoria em nenhum boletim. E na Colômbia? Também não há auditoria em nenhum boletim", continuou.

Não é correto. O Tribunal Superior Eleitoral, que irá enviar especialistas para acompanhar o processo eleitoral na Venezuela, ressaltou hoje que o Boletim de Urna é um documento que pode ser auditado integralmente.

As fiscalizações são realizadas antes, durante e após as eleições. Uma regra do Tribunal Superior Eleitoral assegura às entidades de fiscalização o acesso antecipado aos sistemas eleitorais e a supervisão das atividades para definição e implementação.

Além disso, os Tribunais Regionais Eleitorais realizam, como rotina, no dia das eleições, duas verificações das urnas por amostragem: o Teste de Integridade e o Teste de Autenticidade. Em 2024, assim como aconteceu em 2022, a Justiça Eleitoral também realizará o Teste de Integridade com Biometria, em locais específicos de votação.

Em março, antes de a oposição venezuelana se unir em apoio a Edmundo González, Lula expressou sua crítica ao fato de que Corina Yoris, a favorita de Marína Corina Machado, não pôde registrar sua candidatura à Presidência. O petista considerou sério que a candidata tenha sido impedida de se registrar. Ele afirmou que não há justificativa para tal ato, seja ela jurídica, política ou de qualquer natureza, proibir um adversário de se candidatar.

Algum tempo atrás, o Ministério das Relações Exteriores declarou que estava observando o processo eleitoral na Venezuela com atenção e apreensão, e opinou que a proibição da candidatura de Yoris ainda não havia sido explicada oficialmente.

A reação da Venezuela não demorou a chegar e partiu do ministro das Relações Exteriores, Yvan Gil, que emitiu uma nota de repúdio ao pronunciamento do Ministério das Relações Exteriores, considerando-o "monótono e intervencionista, redigido por funcionários do departamento de relações exteriores brasileiro, que aparenta ter sido influenciado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos".

Naquela ocasião, a fricção intensificou-se e atingiu um patamar diferente. Até aquele momento, Lula avaliava com mais cuidado suas declarações, como parte de seu esforço para restabelecer ao Brasil um papel de intermediário nas tensões sul-americanas.

Um caso emblemático é a tensão entre Venezuela e Guiana. Numa consulta popular realizada em dezembro de 2023, a maioria dos venezuelanos que participaram, mais de 95%, votou a favor da criação de uma província em Essequibo, um território abundante em petróleo controlado por Georgetown e reivindicado por Caracas.

Naquela ocasião, Lula foi contatado por Maduro por telefone e, de acordo com as informações fornecidas pelo Palácio do Planalto, "expressou a crescente inquietação dos países sul-americanos em relação à questão do Essequibo".

Durante a conversa, o partidário ressaltou a relevância de não tomar medidas unilaterais que pudessem resultar em um aumento da tensão. Foram palavras menos severas do que as usadas atualmente, devido à proximidade das eleições na Venezuela.

No mês de fevereiro, Lula visitou a Guiana e teve um encontro com o presidente Mohamed Irfaan Ali, onde enfatizou a importância da paz na região e evitou fazer críticas diretas a Maduro. "A parceria entre Brasil e Guiana é uma parte fundamental da estratégia para auxiliar no progresso da região e para manter a América do Sul como um local de paz no mundo. O que precisamos é de diálogo e cooperação, não de conflitos."

O desfecho da eleição presidencial no próximo domingo e a reação dos candidatos serão um teste crucial para o governo Lula no cenário internacional. Se Maduro perder, a comunidade internacional exigirá a transição de poder. Se ele ganhar, é possível que vários países levantem questões sobre a legitimidade do processo eleitoral. De qualquer maneira, o Brasil terá um desafio delicado pela frente.

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