Brics na Rússia: o que reunião dominada por Putin e China significa para o futuro do Brasil do bloco?

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Rússia

De acordo com especialistas entrevistados pela BBC News Brasil, o panorama atual representa um desafio significativo para o Brasil, que agora precisará ponderar os custos e vantagens de integrar um grupo que se amplia em função dos interesses de Pequim e Moscou.

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Foto BBC Brasil

De acordo com Laura Trajber Waisbich, pesquisadora da Universidade de Oxford, o crescente nível de tensão entre a Rússia e a China, de um lado, e os Estados Unidos, a Europa e seus aliados, de outro, traz à diplomacia brasileira uma série de considerações mais elaboradas.

“Os gastos e vantagens estão se alterando constantemente”, afirma a especialista em relações internacionais. “Caso o Brics se torne uma plataforma que apenas represente os interesses da Rússia ou da China, o Brasil sairá perdendo.”

“O preço representa um aumento na distância em relação ao Ocidente”, conclui.

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Marco Vieira, docente do Departamento de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade de Birmingham, sustenta que o governo brasileiro não deve se distanciar de seus parceiros no bloco neste momento, visto que o Brics continua sendo uma plataforma significativa.

“Porém, também não pode parecer que está se ajustando demais”, afirma. “É um desafio considerável.”

“Males Que Trazem Benefícios”

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O local do encontro dos Brics foi a cidade russa de Kazan, tendo Vladimir Putin como o anfitrião da cúpula.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) compareceu à reunião apenas de maneira virtual, devido a um acidente doméstico ocorrido poucos dias antes. Assim, a delegação brasileira foi liderada em Kazan pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira.

Além dos nove membros oficiais, Putin estendeu o convite a mais de 20 países que demonstraram interesse em se unir ao Brics para participar da reunião.

O grupo que até o final do ano passado era formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul passou a incluir também Egito, Irã, Emirados Árabes Unidos e Etiópia a partir de 2024.

Na cúpula de Kazan, os líderes nacionais debateram e ratificaram a implantação de uma nova classe de colaboradores do grupo. Esses parceiros não terão plenos direitos de participação, mas poderão aproveitar diversas vantagens oferecidas pelos Brics.

A relação oficial dos membros ainda não foi tornada pública, mas 13 países são mencionados nos bastidores da liderança: Turquia, Indonésia, Argélia, Belarus, Cuba, Bolívia, Malásia, Uzbequistão, Cazaquistão, Tailândia, Vietnã, Nigéria e Uganda.

No total, no entanto, a Rússia declarou que mais de 30 nações expressaram vontade de integrar o novo sistema antes do encontro.

Diante de tudo isso, o encontro foi considerado uma chance para Vladimir Putin tirar fotografias ao lado de seus pares, promover a imagem de que não está em isolamento e fortalecer sua influência na geopolítica global.

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Foto BBC Brasil

De acordo com os especialistas, a liderança da Rússia no sistema de rotatividade do bloco, juntamente com a própria dinâmica da política internacional contemporânea, tem ajudado a fortalecer a percepção "anti-Ocidente" dos Brics.

Segundo Vinícius Vieira, docente da Fundação Armando Alvares Penteado (Faap) e da Fundação Getulio Vargas (FGV), a postura mais assertiva da China, observada nos últimos anos, também influenciou esse novo direcionamento. [Embora compartilhem o mesmo sobrenome, não existe nenhum vínculo de parentesco entre os dois entrevistados e o ministro das Relações Exteriores do Brasil.]

"Entretanto, a ausência de Lula em uma visita pessoalmente ajudou a evitar que ele fosse fotografado ao lado de Putin, o que, no cenário atual, poderia prejudicar ainda mais sua imagem e a do Brasil perante o Ocidente", analisa Vinícius Vieira. "Como diz o ditado popular: 'há males que vêm para o bem'."

Dois países que demonstraram interesse em integrar a nova categoria de parceiros dos Brics, mas que não foram incluídos na lista final, são a Venezuela e a Nicarágua.

A administração do presidente Lula não era favorável à entrada de nenhum desses dois países e, conforme relataram fontes que estavam na reunião, um veto não oficial garantiu que a posição do Brasil prevalecesse.

O presidente do Brasil tem feito observações negativas sobre Nicolás Maduro e sua recusa em tornar públicas as atas das eleições de julho, onde afirma ter sido o vencedor. Em relação à Nicarágua, o descontentamento brasileiro se deve ao recente congelamento nas relações com esse país.

Antigo colaborador de Lula, o dirigente nicaraguense Daniel Ortega decidiu expulsar o embaixador brasileiro de Manágua em agosto. Em retaliação, o Brasil adotou a mesma medida com a embaixadora nicaraguense em Brasília.

Contudo, as duas nações são vistas como parceiras da China e da Rússia. Nicolás Maduro fez uma aparição inesperada na cúpula, o que muitos interpretaram como uma estratégia da Rússia em apoio ao governo chavista.

“A inclusão da Venezuela e da Nicarágua não traria benefícios ao Brasil neste momento, portanto, essa restrição pode ser vista como uma conquista significativa nesta cúpula”, analisa Vinícius Vieira.

Entretanto, segundo Marco Vieira, docente da Universidade de Birmingham, a postura do Brasil na cúpula certamente impactará as relações com Caracas no futuro.

"O veto não contribuirá para melhorar uma relação que já se encontra bastante abalada", afirma.

Um Brics Em Constante Expansão

Se a proibição da entrada da Venezuela no bloco foi interpretada como um triunfo, a ampliação dos Brics, com a inclusão de uma nova categoria de parceiros, é percebida por especialistas como um obstáculo para as aspirações do Brasil dentro do grupo.

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Foto BBC Brasil

"Desde o início, ficou evidente que este projeto de expansão não é de origem brasileira", afirma Laura Trajber Waisbich. "A proposta de incluir mais membros, que resultou nos atuais 9, surgiu da China e do próprio projeto de influência chinês."

A mais recente expansão, em colaboração com as nações parceiras, favorece mais os interesses de Pequim e Moscou do que os de outros países, afirma a pesquisadora da Universidade de Oxford.

“Historicamente, a lógica tem sido integrar um grupo seleto de nações consideradas geopoliticamente significativas e com capacidade de desafiar”, afirma.

De acordo com Waisbich, o governo Lula tem demonstrado de maneira evidente em suas manifestações que a inclusão de novos membros a cada ano está completamente fora de seus planos. No entanto, até agora, o país não aparenta ter a capacidade necessária para interromper esse processo.

Em uma conversa com a CNN Brasil, Celso Amorim, assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência da República, declarou que a inclusão de novas nações deve ser cuidadosamente analisada.

“Não faz sentido incluir mais países, pois logo teremos um novo G-77”, afirmou Amorim, destacando a importância de que os Brics sejam expandidos com nações que tenham características capazes de contribuir em um cenário global “polarizado e multipolar”.

Diante de tudo isso, os especialistas afirmam que o progresso em algumas das questões promovidas pelo Brasil, como a desdolarização da economia global, foi bastante limitado.

Uma das principais preocupações do Brasil em Kazan era definir critérios e requisitos fundamentais para a aceitação dos países parceiros.

De acordo com o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, esse aspecto foi tratado nas reuniões. “Foi debatido e aceito - houve um entendimento comum - sobre os princípios e diretrizes que orientarão essa expansão”, afirmou o ministro aos repórteres.

Mauro Vieira declarou também que o Brasil apoia a inclusão de 10 nações parceiras neste primeiro estágio, e que a lista definitiva será estabelecida após a consulta a todos os membros existentes.

Contudo, a declaração conclusiva da cúpula aborda a formação da categoria de nações associadas, mas não menciona os critérios divulgados pelo ministro das Relações Exteriores do Brasil.

Vinícius Vieira esclarece que a entrada de novos membros em organizações internacionais sempre traz o risco de diminuição do poder e da influência dos membros já existentes.

No entanto, de acordo com o docente da FGV, é viável perceber vantagens para o Brasil na situação que está se formando.

De acordo com Vinícius Vieira, caso a relação de 13 aliados que está sendo discutida nos bastidores se concretize, o Brasil poderá se beneficiar significativamente com a inclusão de outras nações que adotam uma abordagem de não-alinhamento.

“Turquia, Indonésia, Vietnã e Nigéria são exemplos de nações que se assemelham ao Brasil ao se recusar a estabelecer uma aliança, tanto com o Ocidente quanto com a Rússia e a China”, declara.

De acordo com o especialista, essas nações apresentam características de liderança regional e demonstram, tanto por sua localização geográfica quanto por seu passado colonial, a habilidade de atuar como intermediárias entre os dois principais centros de poder geopolítico atuais.

Assim, segundo Vinícius Vieira, elas poderiam se tornar parceiras do Brasil na busca por reencontrar os objetivos originais dos Brics.

Simultaneamente, a relação preliminar de potenciais colaboradores inclui nações com extensos mercados internos, o que pode ser vantajoso também do ponto de vista econômico para o Brasil, acrescenta.

Brasil: Destaque Em 2025

De acordo com o sistema de rodízio estabelecido entre os Brics, o Brasil ocupará a presidência do grupo em 2025.

Na opinião de Marco Vieira, da Universidade de Birmingham, essa postura pode oferecer ao Brasil um maior impulso na realização de suas metas com o grupo.

É responsabilidade do presidente em exercício, por exemplo, escolher os países que serão convidados a participar da cúpula e estabelecer os tópicos principais que estarão na pauta das reuniões.

No entanto, o especialista não acredita que os desafios vão se dissipar com facilidade. “Além disso, esses obstáculos também se reproduzem no contexto do G20”, afirma.

O Brasil ocupa atualmente a presidência do G20. O grupo é formado por países como África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia, e se encontrará em Brasília entre os dias 6 e 8 de novembro.

“O Brasil também precisará adotar uma postura em relação à atual polarização - uma posição que se torna mais desafiadora devido aos caminhos que o Brics está seguindo”, conclui Marco Vieira.

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