O cúmulo do acúmulo

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Salário mínimo

A Justiça do Trabalho é frequentemente confrontada com novos temas e solicitações em petições iniciais nas ações sob sua responsabilidade. Além das horas extras frequentes, o pedido de acúmulo de funções tem se destacado pela criatividade dos advogados nos últimos anos, podendo causar um aumento significativo nos custos trabalhistas no Brasil e, o que é pior, de maneira retroativa.

É assim que funciona: o empregado é contratado para desempenhar uma determinada função, com o salário acordado entre ele e o empregador, respeitando as normas legais (salário mínimo, piso regional, piso profissional ou salário normativo). No contrato de trabalho, são definidas as atividades e obrigações que o empregado deverá cumprir dentro da função acordada.

É aí que surge a questão. Em nossa legislação, não existe uma regra obrigatória que determine quais atividades podem ser realizadas em cada cargo, exceto para profissões regulamentadas, como a de advogado.

É comum fazer referência à CBO, uma norma administrativa brasileira que categoriza as atividades realizadas pelos trabalhadores, sejam eles empregados ou não. Essa classificação é utilizada para orientar as políticas públicas, conforme explicado no site oficial do governo federal.

A CBO é um instrumento que reflete as ocupações existentes no mercado de trabalho do Brasil. Ela foi criada por meio da Portaria nº 397, de 10 de outubro de 2002, conforme previsto em lei.

A CBO mantém sua filosofia de estar sempre atualizada para refletir as diferentes atividades profissionais em todo o país, sem fazer distinção entre profissões regulamentadas e aquelas de livre atuação. Isso acontece devido à constante mudança no mercado de trabalho.

A Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) reconhece a existência de uma ocupação específica, mas não regula a mesma. A regulamentação de uma profissão, ao contrário da CBO, é feita por meio de uma lei aprovada pelo Congresso Nacional, com a participação de Deputados e Senadores, e que deve ser sancionada pelo Presidente da República. A CBO não tem autoridade para regulamentar profissões.

As informações fornecidas por você contribuem para as estatísticas de emprego e são essenciais para a criação de políticas públicas relacionadas ao mercado de trabalho.

Os trabalhadores se sentem apoiados e reconhecidos ao terem acesso a um documento elaborado pelo governo que define e valida suas profissões. A inclusão das ocupações na CBO tem proporcionado uma maior visibilidade e um sentimento de valorização e integração social, tanto para as categorias profissionais quanto para os trabalhadores. A atualização da CBO geralmente ocorre anualmente, com o objetivo de revisar as descrições e incluir ocupações e famílias ocupacionais que abranjam todos os setores da economia e do mercado de trabalho, não se limitando a um setor específico.

Analisando, como exemplo, uma das profissões listadas pela CBO, nota-se a complexidade de identificar, com base nesses dados, quais são as atividades e obrigações atribuídas a um funcionário no desempenho de suas funções. Para isso, busque-se o que a CBO descreve sobre a função de "auxiliar administrativo":

Realizam atividades de suporte nos setores de RH, administração, financeiro e logística; abastecem fornecedores e clientes com informações sobre produtos e serviços; lidam com diversos tipos de documentos, seguindo todos os procedimentos exigidos para cada um deles.

Então, imagine-se no papel de um empregador que precisa contratar um assistente administrativo e combina um salário para realizar certas tarefas, como trabalhar na documentação do departamento financeiro de uma empresa.

Após um período de tempo, tornou-se evidente que as atividades empresariais estão sujeitas a mudanças e que avanços tecnológicos estão impactando a forma como as tarefas são realizadas. Dessa forma, o empregado também será responsável pela gestão da documentação relacionada a questões administrativas. Isso caracteriza um acúmulo de funções?

Atualmente, é exatamente esse tipo de situação que tem causado um aumento nas reclamações trabalhistas. Isso acontece porque, ao alegar acúmulo de funções, o trabalhador passa a reivindicar um aumento salarial que pode chegar a 40%, determinado pelo juiz. Além disso, esse aumento normalmente é concedido de forma retroativa, mesmo que o trabalhador já tenha saído da empresa.

São situações bastante curiosas, se não fosse o impacto negativo na economia. Já presenciei casos de alegação de acumulação de funções de vendedor e motorista, pois a empresa disponibilizou um carro para que o empregado vendedor se deslocasse até os clientes. Sim, o vendedor queria receber um salário dobrado por ser o próprio motorista.

É comum o cenário em que os funcionários domésticos são contratados para realizar serviços de limpeza e organização, mas acabam também assumindo tarefas na cozinha, gerando assim um pedido de acúmulo de funções.

Observa-se que não há trabalho em excesso sendo considerado, já que a jornada previamente acordada está sendo cumprida conforme o normal. A questão aqui é apenas um pedido de aumento salarial devido ao acréscimo de responsabilidades que supostamente pertencem a outra função.

A situação, simplificada como está, resulta em mais uma ocorrência em que se confirma a profecia creditada a Pedro Malan: "no Brasil até o passado é incerto". Transpondo para o campo do direito trabalhista, poderíamos afirmar que "no Brasil o gasto com mão de obra é incerto".

Evitando Acumulação De Funções

Para evitar abusos na aplicação da teoria do acúmulo de funções, penso que é importante considerar alguns critérios para garantir ao menos um mínimo de lógica na solicitação. Segue abaixo três pontos iniciais para abrir a discussão sobre o assunto e uma séria advertência será feita.

Antes de mais nada, é preciso especificar qual é exatamente a função que se deseja que seja reconhecida como acumulada, qual o valor do salário dessa função e a justificativa para esse patamar salarial (se é comparado a um funcionário paradigma, se é parte de um plano de cargos e salários, de um piso normativo, etc.). Essa medida é importante, pois ao solicitar um aumento de 30 ou 40% por acumulação, é claro que não deve haver o risco do trabalhador passar a receber um salário maior do que receberia se estivesse exercendo completamente a nova função. Isso poderia esvaziar ou ignorar o princípio da equiparação salarial (previsto no artigo 461 da CLT).

Tenha em mente: se a pessoa que está reclamando não atende aos critérios para ter o salário equiparado, seria ilógico que, através do "acúmulo de funções", ela passasse a receber igual ou até mais do que a referência.

Caso a função que alegadamente foi acumulada tenha um salário igual ou menor ao da função exercida pelo reclamante, parece não haver ocorrido nenhum dano financeiro ao trabalhador que justificasse um aumento salarial, já que uma possível mudança qualitativa em sua atividade, se de fato ocorreu, não resultou em prejuízo algum.

Em terceiro momento, é necessário mencionar por quanto tempo o funcionário fica responsável por acumular as novas tarefas da função que afirma estar acumulando. Deve-se levar em consideração o princípio da proporcionalidade ao estabelecer o acréscimo salarial, uma vez que acumular diariamente durante toda a jornada é diferente de acumular apenas uma vez por semana durante uma hora por dia.

Considerando os três fundamentos mencionados, acredito que a questão do acúmulo de funções pode fazer sentido de alguma forma. No entanto, é importante ressaltar que não se deve avançar nesse assunto sem um aviso sério: não configura acúmulo de funções simplesmente a alteração ou aceitação de novas responsabilidades relacionadas à função inicialmente acordada, e também não se aplica o artigo 460 da CLT, já que houve um acordo salarial no contrato de trabalho.

Na realidade, nossa legislação não prevê a possibilidade de aumento de salário pelo acúmulo de funções, o que já seria motivo para negar qualquer pedido nesse sentido. Além disso, o artigo 456 da CLT impede a tese do acúmulo, pois sugere que o empregado deve realizar qualquer serviço compatível com sua condição pessoal.

Como é bem sabido, a questão é que a lei é frequentemente ignorada pelo Poder Judiciário. Portanto, deve existir ao menos algum parâmetro para orientar aqueles que decidem se aventurar no Brasil.

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