Seguranças impediram a saída das vítimas como mostra a série?

Produção mostra funcionários da balada bloqueando a porta enquanto a fumaça que matou mais de 200 em questão de minutos se espalhava

Inspirada no livro-reportagem "Todo Dia a Mesma Noite", que aborda em minúcias como se deu o mortal incêndio da Boate Kiss, a série de mesmo nome chegou na Netflix na última quarta-feira, 25, apenas dois dias antes do triste episódio completar uma década. 

Para aqueles que acompanharam a tragédia brasileira pelos noticiários em 2013, os eventos retratados, embora tenham sido ficcionalizados na produção, servem para refrescar na memória os detalhes do terrível evento. Já para outros, que são muito novos para lembrarem do ocorrido com clareza, o seriado é seu primeiro contato com o desastre. 

Uma dúvida que pode surgir entre ambos os grupos de espectadores, por sua vez, é se os seguranças da balada localizada na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, realmente barraram os jovens desesperados que tentavam fugir das chamas e da fumaça tóxica que rapidamente se espalhou pelo local. 

Durante emergências, cada minuto é valioso, e a demora para que a única saída do clube noturno fosse liberada teria sido a diferença entre a vida e a morte para algumas das vítimas do incêndio. 

Em outras palavras, quando analisamos a situação de forma retroativa, parece inimaginável que alguém teria realmente pensado em bloquear as portas da Boate Kiss enquanto seu interior se transformava em uma câmara de morte. Entenda abaixo o que realmente ocorreu naquela fatídica noite. 

Depoimento das testemunhas Fotografia da fachada da Kiss após tragédia / Crédito: Divulgação/ Leandro LV/ Creative Commons/ Wikimedia Commons

Ainda em 2013, uma investigação policial se dedicou a apurar as causas do incêndio, realizando para tanto algumas audiências públicas em que sobreviventes da tragédia foram ouvidos. 

Entre eles, estava André de Lima, um dos seguranças trabalhava no local quando o fogo se iniciou. De acordo com funcionário da Boate Kiss, ao encarar a multidão se dirigindo à saída, pensou que teria ocorrido uma briga ali dentro. As informações foram repercutidas na época pelo G1. 

Ele, assim como outros membros da equipe, prosseguiu fazendo o mesmo procedimento que executava todas as noites: segurado as portas até que as comandas dos clientes fossem devidamente coletadas, garantindo assim que os itens consumidos por cada um foram pagos antes de liberá-los para a rua. 

Foi apenas após Kiko, o sócio da casa noturna que administrava o dia a dia do negócio, orientar os seguranças a permitirem a passagem, que André percebeu se tratar de uma situação diferente daquelas a que estava acostumado. Ao tentar se juntar à multidão em fuga, o homem acabou sendo pisoteado: "Me sinto vítima", afirmou em audiência. 

De acordo com uma matéria também de 2013, essa da Gazeta Gaúcha, muitos sobreviventes relataram ter encontrado dificuldades para fugir do estabelecimento pelo fato dos seguranças terem barrado a saída por vários minutos. "Alguns seguranças pediam a comanda para pagar", afirmou Murilo Lima ao veículo. 

Cena da série "Todo Dia a Mesma Noite" / Crédito: Divulgação/ NetflixO incêndio 

A tragédia da Boate Kiss começou quando o vocalista da banda Gurizada Fandangueira, a atração daquela noite, acabou ateando fogo por acidente ao forro do teto durante o show pirotécnico que realizava. Vale mencionar que os objetos utilizados durante a apresentação não eram recomendados para uso em ambientes fechados.

O material que forrava a construção, por sua vez, garantindo seu isolamento acústico, consistia em uma espuma barata altamente inflamável — sua presença era uma irregularidade nos protocolos de segurança. 

Havia um extintor de incêndio na lateral do palco, contudo o equipamento não funcionou. Também segundo André de Lima, ele já teria sido usado alguns meses antes durante "uma brincadeira" de um cliente. 

O calor das chamas, à medida que consumia a espuma isolante, produzia uma fumaça escura contaminada de gás cianeto, que é altamente tóxico para humanos. Para piorar tudo, a substância letal não tinha por onde escapar: ainda de acordo com o G1, as janelas da balada estavam obstruídas.

Essa falta de ventilação apropriada da Boate Kiss ajudou a garantir que a fumaça sufocante se dispersasse por todo o ambiente em velocidade recorde. Dentro de cinco minutos, todas as 242 vítimas do desastre haviam morridoasfixiadas por inalarem o cianeto que envenenava o ar. 

Um último detalhe triste é que uma grande quantidade de corpos foi encontrada no banheiro do local, muito provavelmente por confundir a porta com uma saída, já que era a única passagem marcada por um sinal luminoso, sendo, portanto, visível através da fumaça. 

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