Análise: Atentado a Trump reabre um capítulo assustador na política americana | CNN Brasil

14 Julho 2024
Trump

O atentado contra a vida de Donald Trump marca um triste episódio na tumultuada trajetória da violência política nos Estados Unidos, impactando uma nação já fragmentada em um momento de grande tensão de sua história recente.

Mirar em um ex-presidente durante um comício de campanha, pouco tempo antes de aceitar a nomeação republicana, é, sem dúvida, uma afronta à democracia e ao direito de todo cidadão americano escolher seus representantes.

O potencial candidato do Partido Republicano estava presente no palco, acompanhado por seus seguidores habituais nas arquibancadas, segurando placas e vestindo trajes com a frase MAGA (Faça a América Grande Novamente), quando os disparos foram ouvidos.

Ele se retraiu, em seguida, apoiou a mão no rosto e sumiu atrás de sua tribuna, ao passo que os presentes começaram a vociferar e a singularidade do momento começava a se revelar.

Posteriormente, o ex-presidente relatou ter sentido um projétil cortar a pele de sua orelha, que sangrou enquanto era rapidamente retirado do local. Os disparos feitos por um atirador no telhado, fora do perímetro de seu comício em Butler, Pensilvânia, quase causaram danos mais graves.

Uma imagem capturada por Evan Vucci, da Associated Press, mostrando Donald Trump em uma situação desafiadora, mas ainda consciente – com sangue visível em sua orelha e bochecha, sendo escoltado para fora do palco por agentes do Serviço Secreto, com o punho erguido e uma bandeira dos Estados Unidos ao fundo – rapidamente se tornou um ícone.

A representação visual irá marcar um período político conturbado, sem se importar com as implicações políticas ainda incertas de um dia ensolarado que se transformou em um pesadelo.

Trump é Retirado De Comício Em Vídeo

O ruído dos disparos e a cena de um líder político caindo no chão - com agentes do Serviço Secreto correndo para se lançarem sobre ele para protegê-lo - evocaram profundas lembranças históricas.

Mesmo que Trump não esteja mais ocupando o cargo de presidente, seu ataque destaca a constante ameaça que paira sobre a posição e sobre os candidatos a ela - principalmente para aqueles que a desejam.

Joe Biden é o 46º presidente, e durante seu mandato quatro de seus antecessores perderam a vida, incluindo John F. Kennedy em 1963.

A agressão a Trump marca o fim de quatro décadas em que se acreditava que a competência do Serviço Secreto havia diminuído consideravelmente o risco de ataques desse tipo - e projetará uma influência duradoura por longos anos.

Durante a campanha presidencial, Trump sendo alvo gerou comparações com o assassinato do candidato democrata Robert F. Kennedy em 1968, um ano marcado por eventos sangrentos, incluindo a morte de Martin Luther King Jr. e a violência na Convenção Nacional Democrata em Chicago - cidade que sediará o mesmo evento este ano.

Contudo, a violência política não cessou desde aquele momento. No ano de 2011, Gabrielle Giffords, uma democrata do Arizona na época, sofreu lesões cerebrais ao ser atingida por um tiro na cabeça durante um evento onde seis pessoas perderam a vida.

No ano de 2017, um indivíduo armado disparou tiros durante um treino de beisebol do Congresso Republicano, ferindo o líder da maioria na Câmara na época, Steve Scalise, e mais três pessoas. A população ainda está lidando com a invasão ao Capitólio dos Estados Unidos por seguidores de Trump em 6 de janeiro de 2021.

Durante o comício, Joseph Meyn, um defensor de Trump, testemunhou a queda do ex-presidente e percebeu de relance o homem sendo agredido. Mesmo abalado com o ocorrido, ele se expressou de forma eloquente em entrevista à CNN, descrevendo o ataque como um reflexo da crescente fúria política que consome o país.

"Parece que todo mundo está cheio de indignação. Parece que há muitas pessoas enraivecidas por aí. Não estou surpreso que isso tenha ocorrido. Estou espantado de ter presenciado aquilo ao meu lado", expressou ele.

É absolutamente terrível. Não era para estarmos em um patamar tão baixo no debate político deste país para que isso aconteça.

John F. Kennedy, Robert F. Kennedy, Martin Luther King... houve um ataque contra a vida de Ronald Reagan e agora uma tentativa de assassinato de Trump. É absurdo. A política não deve ser um jogo em que alguém vence tudo e perde tudo.

Nova Reviravolta Eleitoral: Surpresa Total

Os eventos impactantes do último sábado (13) acrescentaram mais um componente político instável a um ano eleitoral agitado e imprevisível, no qual Biden - o presidente mais idoso da história - enfrentou dificuldades para manter sua nomeação após um debate desastroso e a condenação de Trump, de 78 anos, por um tribunal de Nova York, além de suas promessas de buscar um segundo mandato baseado em "retribuição" caso seja reeleito.

A reação inicial ao horror foi apenas um sentimento de alívio ao saber que o candidato à Presidência ainda está ileso, juntamente com o pesar pela perda do apoiador de Trump que foi brutalmente assassinado durante o comício onde exercia suas liberdades democráticas.

A maior parte dos líderes e figuras políticas de ambos os espectros prontamente enviaram mensagens de solidariedade a Trump e apelaram pela serenidade.

Biden, que dedicou vários dias para fortalecer sua campanha, assumiu sua função como líder do governo nacional após ser informado do tiroteio enquanto participava da missa em Rehoboth Beach, Delaware. Ele emitiu um comunicado por escrito e posteriormente dirigiu-se ao país em um vídeo.

"Neste país, não há espaço para esse tipo de violência - é perturbador, é prejudicial, é um dos motivos pelos quais devemos unir a nação. Não podemos permitir que isso ocorra. Não podemos agir desta maneira. Não podemos aceitar isso", afirmou Biden.

Ele também mencionou ter tentado contatar "Donald" e declarou que o ex-presidente estava em um evento público que "deveria ter transcorrido tranquilamente, sem contratempos". O atual presidente, que mais tarde conseguiu conversar com seu antecessor, encerrou prematuramente seu fim de semana em sua residência à beira-mar e retornou a Washington.

Dada a intensa polarização política nos Estados Unidos, o impacto inicial da tentativa de assassinato certamente terá sérias consequências políticas.

Os apoiadores de Trump já o consideravam um herói imbatível e tratavam-no quase como um ícone sagrado em seus comícios. Sua imagem como um combatente que está sempre sendo atacado por seus oponentes será ainda mais firmemente estabelecida.

Em um momento de serenidade após ser agredido, o ex-presidente decidiu criar um momento marcante de resistência levantando o punho e incentivando sua plateia a lutar - olhando diretamente para a área onde estavam localizadas as câmeras de TV.

As fotografias ficarão marcadas para sempre e irão enriquecer a lenda de Trump, assim como a imagem de quando foi preso em Atlanta e os vídeos de quando regressou à Casa Branca em 2020 após vencer uma doença grave de Covid-19.

Também podem ocorrer consequências inesperadas para uma eleição onde Trump liderava Biden - mesmo antes da campanha do presidente começar a declinar com seu desempenho desastroso no debate. Além disso, a atmosfera em torno da Convenção Nacional Republicana em Milwaukee, esta semana, será ainda mais tensa.

No sábado, surgiram solicitações de investigações sobre como um atirador - que estava fora do perímetro de segurança do comício - conseguiu mirar em Trump, revelando uma grande falha na segurança que terá repercussões duradouras e afetará todos os eventos presidenciais e de campanha no futuro.

Diversos políticos de diferentes correntes já estão expressando arrependimento em relação à intensidade da linguagem política, após mais uma evidência alarmante do impacto que ela pode causar em um país onde as armas são tão facilmente disponíveis.

A questão que permanece é se o impacto dos acontecimentos do sábado, que poderiam ter sido ainda mais graves, terá algum efeito em suavizar uma cultura política nociva na qual Trump participa ativamente.

Em uma das declarações mais emocionantes, Giffords afirmou: "O terror da violência política, eu compreendo". Ela ainda expressou: "Tenho em meu coração o ex-presidente Trump, e todos que foram afetados pelo ato de violência inaceitável de hoje. A violência política vai contra os valores americanos e nunca deve ser tolerada - nunca."

Infelizmente, a história mostra que a violência, mesmo que injustificável, também é uma marca essencial na política dos Estados Unidos.

Este conteúdo foi originalmente produzido em língua inglesa.

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