Esqueça a Fórmula 1, o novo esporte preferido de bilionários como Tom Brady e Will Smith é esta corrida de barcos de luxo
Mônaco, um marco na história do automobilismo global, testemunhou o surgimento de um novo esporte no final de julho, quando os velozes automóveis da Fórmula 1 deram lugar à corrida de lanchas elétricas da E1 Series. Estas embarcações, praticamente silenciosas — exceto pelo som do contato com a água após um breve momento de voo —, chegam a alcançar quase 100 km/h e lembram pequenas naves espaciais. No entanto, não vieram de um planeta distante; acabaram de ser concebidas em um armazém onde hábil engenheiros se reuniram para desenvolver um modelo exclusivo de barco elétrico de alto desempenho para competições, sem a utilização de qualquer combustível.
A prova inaugural do campeonato recém-criado ocorreu em fevereiro deste ano, em Jeddah, na Arábia Saudita. A última etapa estava agendada para o final de agosto, no Lago de Como, na Itália. Mesmo com pouco tempo de existência, o esporte já conquistou grandes nomes. Os esportistas Tom Brady, Rafael Nadal e Didier Drogba, além do ator de Hollywood Will Smith, recentemente se tornaram proprietários de equipes na competição. O Brasil também possui uma equipe oficial.
No começo da pandemia, o italiano Rodi Basso, de 51 anos, e o espanhol Alejandro Agag, de 53, estavam dialogando sobre novos empreendimentos. Um deles, em especial, chamou a atenção de ambos: Agag tinha recentemente feito um investimento na Seabird Technologies, uma startup da designer de iates Sophi Harne, que cria soluções tecnológicas voltadas para a descarbonização dos meios marítimos.
Basso finalizou a conversa e teve uma inspiração. Em apenas um dia, já havia elaborado um plano com estratégias bem definidas. “Entre em contato com o Ale (Agag) e perguntei: por que não desenvolvemos uma Fórmula 1 elétrica sobre a água?”, relata. “A partir disso, apresentamos a ideia a investidores, conseguimos financiamento e começamos a projetar e construir os barcos”, detalhou à GQ Brasil.
Para tornar realidade os racebirds, nome dado aos veículos elétricos projetados especialmente para a E1 Series, a dupla investiu em uma equipe de profissionais altamente qualificados. Basso, que é engenheiro aeroespacial, possui um extenso histórico que inclui consultorias para a NASA, além de ter contribuído para a conquista de cinco campeonatos de Fórmula 1 como engenheiro de corrida na Ferrari, e quase quatro anos liderando a equipe de tecnologia da McLaren. Por sua vez, Agag transformou a eletrificação no automobilismo ao fundar, em 2014, a Fórmula E, campeonato dedicado a carros elétricos.
Sob a liderança de Sophi Harne, os programadores tiveram que demonstrar aos investidores e ao público em geral que era, de fato, viável construir uma embarcação de competição totalmente elétrica e de alto desempenho. A ideia para a lancha foi inspirada nas aves (daí o nome "racebird"), especialmente nos movimentos ágeis que elas fazem ao sobrevoar a superfície da água.
Além do bico ajustado, os hidrofólios posicionados nas laterais inferiores assemelham-se a grandes asas. Esses componentes projetam o veículo para fora do rio, aumentando sua velocidade (a água é aproximadamente 800 vezes mais densa que o ar, você se lembra?). Os modelos utilizados nas competições podem alcançar 50 nós, o equivalente a cerca de 93 km/h. "É extremamente divertido e desafiador pilotar um racebird, porque é preciso considerar diversas coisas simultaneamente. A grande diferença em relação a outras corridas é, sem dúvida, a água, que está sempre em movimento. Assim, a pista pode mudar a cada volta", observa a finlandesa Emma Kimiläinen, de 35 anos, piloto da equipe de Tom Brady.
Assim como ela, os demais participantes da competição também não possuem experiência prévia em esportes náuticos. Outro aspecto relevante que garante a equidade é que as embarcações são iguais para todas as equipes, sem diferenciações. Ademais, os times só podem competir se contarem com um piloto masculino e uma piloto feminina. Sem a presença de ambos, não há possibilidade de corrida.
"É sempre uma combinação," esclarece Basso. A posição de partida e a classificação final são definidas por uma média das voltas dos dois pilotos. "Aprecio essa ideia, pois ambos precisam trabalhar juntos para alcançarem a vitória. Existe uma discriminação absurda no universo esportivo em relação às mulheres. Não queríamos uma competição segregada. Por isso, não discutimos o desempenho individual, mas sim o desempenho da equipe," acrescenta o engenheiro.
Outra base que fundamenta o novo esporte é a clara preocupação com o meio ambiente, desde a concepção das embarcações, que praticamente não produzem ruído para não incomodar a fauna marinha, até iniciativas de recuperação de áreas costeiras e o empenho em tornar toda a competição mais sustentável. Para liderar essa área, os empresários escolheram o professor espanhol Carlos Duarte, um dos biólogos marinhos e oceanógrafos mais respeitados do planeta.
A seriedade da E1, juntamente com seu potencial de lucro, se tornou uma das razões para atrair tantas celebridades. Personalidades renomadas, como o piloto de corrida Sergio Pérez e o DJ Steve Aoki, ambos com trajetórias consolidadas em diversas áreas, enxergam a competição de barcos como uma oportunidade de investimento. Basso menciona que alguns investidores negociaram suas participações no time por um valor cinco vezes superior ao que foi inicialmente investido. Para muitos deles, isso também representa uma chance de fomentar transformações sociais.
“O grande objetivo me inspirou. Tenho a convicção de que a paixão pelo esporte une as pessoas e, se conseguirmos utilizar essa conexão para gerar um impacto benéfico, então teremos a capacidade de provocar uma mudança significativa juntos”, afirma Marcelo Claure, 53 anos, proprietário do time Brasil. Empresário boliviano, Claure ocupa o cargo de vice-presidente da varejista chinesa Shein, é presidente do clube de futebol Bolívar e um dos fundadores do Inter Miami, equipe onde atualmente joga nada menos que o argentino Lionel Messi.
Com diversos investimentos na América Latina, ele viu como uma sequência lógica a responsabilidade de montar uma equipe para o Brasil. No momento, nenhum dos nossos dois pilotos é brasileiro; a piloto é do Reino Unido e o piloto é da Suécia.
Entretanto, Claure tem o desejo de integrar cada vez mais brasileiros na equipe. Basso menciona que estão em andamento discussões para realizar uma etapa da E1 no Rio de Janeiro. Claure também almeja uma competição na Amazônia. “Esse será o local da COP em 2025. Enxergo uma corrida da E1 (no Brasil) como uma chance de engajar mais a população em nossa proposta de sustentabilidade, pois este é um país que aprecia esportes competitivos. Não consigo imaginar uma competição mais…”