Pragas devastadoras da era romana foram introduzidas por ondas de frio, segundo estudo

Roma

De acordo com um novo estudo, as ondas de frio podem ter sido responsáveis pelo surgimento de pandemias de pragas que foram terrivelmente mortais para os antigos romanos, causando tantas mortes.

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Uma nova pesquisa estabeleceu a conexão entre mudanças climáticas significativas com o surgimento de grandes epidemias, concluindo que as três maiores epidemias romanas ocorreram durante períodos que registraram oscilações bruscas e intensas de temperatura.

De acordo com o co-autor da pesquisa, Kyle Harper, um historiador especializado em Roma da Universidade de Oklahoma e do Instituto Santa Fe, existem diversas possíveis explicações para essa coincidência.

Segundo Harper, ao modificar o sistema climático, há uma importante influência nos agentes patogênicos, nos ecossistemas e, principalmente, nas sociedades humanas.

O estudo se concentra em um extenso centro de sedimentos extraído no Golfo de Taranto, um golfo abrangente situado sob a "sola" da "bota" italiana. Essa região coleta sedimentos carregados pelas águas dos rios Pó e outros rios que escoam das montanhas dos Apeninos - a região central do Império Romano, segundo Harper.

Karin Zonneveld, paleoceanógrafa da Universidade de Bremen, na Alemanha e co-líder da pesquisa, utilizou diversas pistas contidas nos núcleos de sedimento com o objetivo de relacionar as camadas de sedimentos com anos específicos. As informações fundamentais foram obtidas do vidro vulcânico presente nos sedimentos, que podem ser identificados quimicamente como provenientes de erupções conhecidas.

Zonneveld informou por e-mail à LiveScience que muitas destas erupções são notáveis globalmente, como a erupção em 79 dC do Vesúvio que devastou Pompéia.

As evidências mostraram que os depósitos se estenderam de 200 a.C. a 600 d.C., começando ao final da época da República Romana e registrando tudo até a fase derradeira do Império Romano. “É possível ter uma visão geral daquilo que entendemos por história da antiga Roma, começando pela fase republicana tardia”, informou Harper.

Para reconstruir as condições climáticas de temperatura e precipitação, a equipe utilizou dinoflagelados que foram preservados no sedimento. Estes pequenos organismos têm um ciclo de vida muito sensível às condições climáticas. Durante o final e início do outono, eles se transformam em um estado de repouso conhecido como cisto, que é capaz de ser preservado no registro fóssil. Diferentes espécies possuem preferências diversas, assim, os cientistas conseguem calcular quais tipos de dinoflagelados prosperaram em um determinado ano. Em anos mais frios, as espécies que preferem o frio se tornam mais abundantes, enquanto em épocas de elevada precipitação, as espécies que preferem condições com mais nutrientes são mais comuns, pois a água do rio acaba transportando mais nutrientes para o mar.

Os resultados apresentados indicam um estágio climático estável entre 200 e 100 a.C., seguido por uma série de breves épocas de resfriamento. Entre 160 e 180 d.C., houve uma época de frio considerável, o que ocorreu ao mesmo tempo que a Peste Antonina ou a Peste de Galeno, uma pandemia introduzida no império quando as tropas romanas regressaram da Ásia Ocidental. A condição foi desencadeada por um patógeno desconhecido que gerou sintomas, como febre, diarreia e pústulas na pele. (Pesquisadores avaliam que possa ter sido varíola ou sarampo).

Houve um outro período de baixas temperaturas, acontecido entre os anos 245 e 275 d.C., que coincidiu novamente com uma pandemia denominada Peste de Cipriano. Consta nos registros históricos que essa enfermidade provocava vômitos, diarreia e, algumas vezes, gangrena nos membros. Em se tratando da causa da doença, os estudiosos não têm certeza, entretanto, há suposições de que ela possa ter sido derivada do sarampo, varíola ou possivelmente de alguma febre hemorrágica.

Por fim, as evidências ambientais apontam para a existência de um novo período de frio depois do ano 500, que corresponde à Pequena Era do Gelo no final da Antiguidade. Esse resfriamento já havia sido identificado em outros registros climáticos. Em 541, o ocidente da Eurásia sofreu uma epidemia de peste bubônica. Conhecida como Peste de Justiniano, ela antecedeu a Peste Negra que assolou a Europa no século XIII.

Zonneveld afirmou que a conexão entre os períodos em que a Europa enfrentava graves epidemias de enfermidades contagiosas e momentos de clima gélido foi notável.

Harper afirmou que existem diversas cuasas que relacionam os surtos de doenças com o clima, desde alterações ecologicas que tornam mais factível a disseminação de doenças provenientes de animais para os seres humanos, até alterações na resistência humana. Com base em uma sociedade agrícola reminiscente da Roma antiga, o autor indicou que os agricultores possivelmente tiveram dificuldades para obter colheitas suficientes em períodos de frio, resultando em desnutrição que deixava as pessoas mais vulneráveis a doenças.

O assunto é atraente, afirmou Ulf Büntgen, docente de avaliação de sistemas ecológicos na instituição de Cambridge, que não participou da pesquisa. Contudo, existem incertezas acerca da validade da reconstrução climática, conforme declarado ao Live Science.

Segundo Harper, a próxima etapa dos pesquisadores consiste em realizar uma análise mais minuciosa das informações obtidas no núcleo de sedimentos, em conjunto com outros registros climáticos e pesquisas arqueológicas acerca da Roma Antiga.

Zonneveld afirmou que investigar como as sociedades antigas lidaram com as mudanças climáticas em tempos passados pode fornecer uma perspectiva mais clara sobre suas relações e os obstáculos que enfrentamos atualmente devido às transformações climáticas.

Um estudo foi divulgado na publicação Science Advances, enquanto o artigo foi apresentado no LiveScience.

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