Se aprovada, PEC das Drogas pode ser base legal para a internação em massa

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PEC das drogas

Nesta terça-feira, dia 16, a Proposta de Emenda à Constituição 45/2023 foi aprovada no plenário do Senado Federal, estabelecendo que qualquer quantidade de "drogas e afins" que esteja em posse de alguém se torna passível de crime. A proposta, cujo autor é o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), teve a relatoria de Efraim Filho (União-PB) e foi aprovada em primeiro turno por 53 votos a 9 e em segundo turno por 52 votos (confira o voto de cada senador). Especialistas destacam que Pacheco agiu com pressa ao optar por duas votações rápidas, já que existia a possibilidade de perder a margem de apenas cinco votos contrários, o que teria impedido a PEC.

A PEC das Drogas é considerada como um novo capítulo do conflito entre o Legislativo e o Judiciário. Enquanto o Supremo Tribunal Federal pretende legalizar a posse de pequenas quantidades de drogas até junho, o Senado quer estabelecer na Constituição Federal a proibição da posse de qualquer quantidade.

A Proposta de Emenda Constitucional das Drogas está inserindo um novo crime no artigo 5º da Constituição Federal, que trata dos Direitos e Garantias Fundamentais. Essa ação é ilegal e prejudica os direitos e garantias dos cidadãos. O projeto coloca em risco a liberdade de milhões de brasileiros que já fizeram uso de drogas ilícitas, indo na contramão do que é observado internacionalmente. Na última sessão da União das Nações Unidas sobre Narcóticos e Crime, que ocorreu em Viena em março deste ano, mais de 60 países se uniram para pedir uma reforma do sistema internacional de políticas de drogas. A liderança deste movimento foi a Colômbia, representada pelo presidente Gustavo Petro, que assinou uma recomendação contra políticas punitivistas, incluindo as políticas do Brasil.

No meio da mobilização e da pressão popular contra a PEC, o presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) negou que o usuário será penalizado com detenção. De acordo com a Agência Senado, Pacheco declarou que "o usuário nunca será punido com prisão, isso não é uma possibilidade. O usuário não deve ser criminalizado por ser dependente químico." Na mesma direção, o relator do projeto, senador Efraim Filho (União-PB) solicitou que a diferença entre traficante e usuário seja respeitada "em todas as circunstâncias dos casos concretos, com penas alternativas à prisão e tratamento contra a dependência sendo aplicáveis ao usuário".

A aparente condescendência dos legisladores para com os usuários escancara a real motivação por trás da PEC das Drogas. Alegando defender-se do STF, o Senado oferece um presente para a influência das comunidades terapêuticas, instituições privadas que "acolhem" indivíduos dependentes de álcool e outras drogas. Na prática, o Congresso legaliza o confinamento de portadores de drogas nessas entidades com fundamentação constitucional.

O relatório da Inspeção Nacional em Comunidades Terapêuticas, elaborado pelo Ministério Público Federal (Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão) em conjunto com o Conselho Federal de Psicologia e o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, classifica essas instituições como locais de isolamento, que impõem restrições à livre circulação e contato com o mundo exterior. Uma das restrições é a própria localização em áreas de difícil acesso e a presença de cercas, muros e portões, em alguns casos guardados por vigilantes. A maioria das instituições visitadas impede a saída livre de seus pacientes, chegando a puni-los em caso de tentativa de fuga.

Existem muitos relatórios emitidos por órgãos responsáveis pela fiscalização, que indicam a violação de direitos humanos em Centros de Tratamento (CTs). Além disso, há reportagens em veículos de mídia estaduais e nacionais que reforçam essas denúncias. Entre as violações citadas, estão o cárcere privado, sequestro, tortura e exploração de mão de obra similar à de escravos. De acordo com Pedro Costa, professor de Psicologia na Universidade de Brasília, as comunidades terapêuticas são as instituições mais evidentes que aplicam a lógica asilar e manicomial nas políticas de saúde mental.

O setor das comunidades terapêuticas está incluído em um departamento específico do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome. O Departamento de Apoio e Acolhimento de Organizações que Trabalham com Álcool e Drogas, liderado por Sâmio Falcão, deve em breve começar a subsidiar financeiramente as 585 comunidades terapêuticas habilitadas pelo Edital de Credenciamento nº 8/2023. Durante um ano, o governo deverá fornecer mais de 30 milhões de reais para essas instituições.

Enquanto o Poder Executivo assegura o financiamento púbico às Comunidades Terapêuticas, o Poder Legislativo estabelece o arcabouço legal para elas. Mediante diversas normativas, tais como propostas de alteração à Constituição e projetos de lei, o Congresso regulamenta o funcionamento das CTs, concede-lhes imunidade fiscal, flexibiliza os critérios para a obtenção de seus credenciamentos, libera-as da fiscalização dos municípios e, por meio da PEC 45/2023, inclui a "pena alternativa" na Lei Maior. A PEC das Drogas simplismente abre as portas da Constituição Federal para permitir a internação em massa nas CTs.

O Governo Federal, ciente do Congresso ultraconservador e focado na sucessão do presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL), utiliza as CTs como moeda de troca no mercado político para manter a governabilidade. Dessa forma, continua garantindo financiamento público e avanço legislativo às células de mobilização de uma base eleitoral adversa. A elite que defende a escravidão é responsável pela fundação da República Federativa do Brasil e ainda domina o país.

A mensagem contida neste texto não expressa obrigatoriamente o ponto de vista de CartaCapital.

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